A História de Cada Um
Os dias andavam muito carregados. Havia mais de uma semana que as nuvens venciam as batalhas em sua eterna guerra contra o sol. Talvez por causa disso mesmo, a estrela maior, naquele trivial feriado, quis aparecer grandioso, como que para provar seu poder e sua força perante a natureza. Era um domingo de sol. A cidade estava repleta de pessoas, que cansadas da chuva, saÃram de casa com saudade do calor e do brilho solar. Nas praças, as crianças brincavam com suas bicicletas, meninos jogavam bola, meninas pulavam corda ou vice-versa. Na lagoa, namorados redescobriam beijos e carinhos. Nas praias, surfistas pegavam suas ondas, quais caravelas singrando mares nunca dantes navegados. Os idosos recordavam saudosas marcas do passado, mulheres se esforçavam para parecer cada vez mais lindas e os homens atualizavam-se lendo jornais e botando o papo em dia. Tudo era perfeito. Nada, nem ninguém poderia desmanchar tamanha comunhão entre tudo e todos.
Bem, pelo menos, era para ser assim. O que não era esperado, o que não tinha que acontecer, infelizmente aconteceu. Foi tudo tão rápido, foi tão de repente que o caso só não passou despercebido por que foi grave. Ou pelo menos alguns pensaram assim. Uns colocavam a culpa no menino destrambelhado, outros na velhinha desatenta, alguns teimavam em afirmar que quem causou tudo foi o cachorro e teve até quem insistia em recriminar a salsicha.
Ainda era cedo, o sol ainda não havia chegado ao centro do céu. A velhinha, alegre, saudável e bem disposta, andava lépida e fagueira, quando vindo não se sabe de onde, um vulto enorme e peludo chocou-se com ela, fazendo um estrago incalculável. O furacão de pelos, alem de levá-la ao solo, trazia consigo um jovem esbranquiçado pela sua própria cor de origem e pelo pavor de não conseguir dominar aquela terrÃvel fera. A velhinha ainda atordoada não chegou a ver o animal de quatro patas avançar para a carrocinha como um cachorro querendo uma salsicha. Bem, desculpa, mas na verdade, era isso mesmo que estava acontecendo. Era um cachorro avançando para a carrocinha de cachorro quente, sem que ninguém conseguisse dete-lo. O jovem tentava, mas suas forças não eram suficientes para segurar a vontade do animal. Pessoas corriam, gatos fugiam e outros cachorros, atiçados por aquele lÃder canino, sentiram-se no direito de avançar também. Todos queriam salsicha. A carrocinha virou e derramou pela grama um mar de molho e salsichas. A sorte foi que aquele grande animal peludo ficou preso pela guia na carrocinha tombada e com isso, seu frágil dono conseguiu contornar a situação. Com seu lÃder subjugado, os demais cachorros amansaram e cada qual foi para o seu canto com o rabinho entre as pernas. Entre mortos e feridos, salvaram-se todos. Felizmente as salsichas não sofreram nenhuma baixa, e para sua sorte, sujas, não puderam ser consumidas por ninguém. Aliás baixa ninguém sofreu, alto ficou o galo na testa do branco jovem, consequência da bengalada que recebeu da pobre velhinha.
Aos poucos a vida foi tomando seu rumo. O sol brilhava forte e de cima observou tudo com um sorriso irônico. O sol tem dessas coisas.
Essa é apenas uma versão dessa história. Tudo na vida é uma questão de ponto de vista. Veja a versão do garoto, da velhinha, do cachorro e da salsicha no endereço www.marciotrigo.com, no Ãcone “cine”. “A História de Cada Um” é um curta metragem que recebeu apoio do Ministério da Cultura, no edital Curta-Criança de 2006. O filme foi apresentado na mostra oficial do 2º festival de Curtas de Cabo Frio e está na seleção oficial da 7ª Mostra de cinema infantil de Florianópolis.
CARTAZ FEITO POR MARCELO MIRANDA
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Eu assisti em Cabo FRio e adorei!
Pelas risadas, acho que o público tb!
Pena que não fui à Florianópolis!
Mas em Cannes estarei certamente!
Esse Márcio Trigo se supera! rssrsrs!
bj
Patricia